RUA CARLOS DE LACERDA (Antiga Rua do Rosário)
As
ruas perpendiculares ao Rio Paraíba do Sul começaram a surgir em função do
grande movimento nos diferentes portos, com ênfase para o Porto da Barca,
naquela época o maior centro de embarque e desembarque de mercadorias
transportadas pela chamada “Estrada Líquida”, atendendo as necessidades de toda
a região. E dentre as vias mais importantes, estão a atual Rua Teotônio
Ferreira de Araújo (Antiga Rua Barão de Cotegipe) e que, anteriormente teve os
nomes de Rua da Bola, Rua Detrás do Terço e Rua Barão do Triunfo que, no
entanto, só ia até a Rua Formosa, que já existia em 1795.
Naquela
época, portanto, já existia, também, a Rua do Rosário, porque passava/passa
defronte à igreja de Nossa Senhora do Rosário e, como o trecho entre a Beira
Rio (Avenida Rui Barbosa) e a Avenida Sete de Setembro (Rua das Flores) era o
preferido pelos armazenistas de secos e molhados, ficou conhecido, durante
muitos anos, com Rua da Cebola, espaço, também, disputado por estivadores,
carroceiros, proxenetas e (até hoje), por prostitutas herdeiras das que viviam
do intenso movimento do cais...
Mas,
o historiador Júlio Feydit, no livro “Subsídios
para a História de Campos dos Goytacazes” (p. 283), salienta que a via
também, um dia, teve o nome de Miguel Fernandes, sem, contudo, fazer um
histórico sobre o homenageado, mas dá atenção especial à abertura da Rua Barão
de Cotegipe que ele diz que terminava na antiga Rua do Conselho (atual Rua João
Pessoa). Chama atenção ao narrar que a área era tida como do Alferes Joaquim
Vicente dos Reis que, no entanto, não apresentando título de posse, perdeu a
área, o que o fez escrever, em 8 de abril de 1797, à Câmara reclamando a perda
das terras, ao mesmo tempo em que pedia ajuda para aterrar ao que ele chamou de
Lagoa do Rosário, esta desaparecida na reforma urbanística de Saturnino de
Brito, a partir das enchentes de 1906.
A
rua, a primeira de grande extensão, pois adentrava às longínquas paragens do
ainda chamado Parque Rosário, ia até a Rua São Jerônimo e, pelos registros,
atravessava, inclusive, o espaço futuro do denominado Passeio Municipal que,
naquele tempo não tinha, ainda, esta denominação, porquanto isso somente iria
ocorrer com a abertura do paço para a construção das nossas estradas de ferro,
destinadas a escoar a produção agrícola e pastoril das áreas de produção para
os maiores centros consumidores.
O
nome de Luiz Carlos de Lacerda só viria a surgir, como nome de rua, depois da
Abolição da Escravatura e da morte desse paladino das causas abolicionistas, em
19 de março de 1897. Sobre ele quem escreve é Waldir Pinto de Carvalho, “Gente que é Nome de Rua” (p. 119-124).
Ele descreve assim:
“Luiz
Carlos de Lacerda nasceu em Campos no dia 25 de maio de 1853. Inteligente,
espírito combativo, sentimental ao extremo estava fadado a ser o batalhador das
grandes causas humanas. Como José do Patrocínio nasceu num ambiente em que a
escravatura, devido ser o município de Campos um dos que reuniam maior número
de cativos, era instituição normal, meio de multiplicar riquezas pouco
importando as lagrimas e sofrimento de toda sorte dos infelizes que trabalham
sob o mais duro rigor de sol a sol (...)”
O
historiador salienta que Luiz Carlos de Lacerda, com 30 anos de idade, iniciou
suas lutas contra os fazendeiros ambiciosos em favor da libertação dos
escravos. Waldir fala da segunda fase dos abolicionistas em Campos, surgida em
1881:
“(...)
A imprensa da época assim fala da sua chegada à batalha: “(...) Surgiu na arena
abolicionista o heróico Carlos de Lacerda chefiando um pugilo de decididos
adeptos da redenção dos escravos, e com José Barreto, Amaro Bastos Rener, João
Guarulhos de Souza, Francisco de Paula Guimarães e Casemiro José da Silva,
fundou, no dia 17 de julho de 1881, a Sociedade Campista Libertadora (...)”.
Para
defender seu desiderato, fundou ele o Jornal “25 de Março”, homenagem à data em
que o Ceará aboliu a sua escravidão, em 1881, tendo alcançado seus objetivos,
todos registrados no livro de Feydit, inclusive a vitória final e a perseguição
sofrida pelas chamadas classes dominantes até sua morte, praticamente em estado
precário de saúde, provocado, exatamente, pelas pressões psicológicas dos que
perderam seus escravos, considerados à época como mercadoria, como se fosse
possível alguém ser dono de alguém.
As
ações de Luiz Carlos de Lacerda em favor da liberdade dos escravos foram tão
mais importantes do que as de José do Patrocínio. A cidade, além de um simples
nome de rua, deve muito mais a este campista ilustre que, numa época difícil,
conseguiu lutar contra a chamada aristocracia rural campista, uma das mais
tradicionalistas da história do país.
Centro Histórico
O
centro histórico da cidade de Campos dos Goytacazes foi praticamente
consolidado, a partir do Plano Urbanístico do sanitarista Francisco Rodrigues
Saturnino de Brito, planejado em 1902, muito embora as obras de organização
urbana somente tenham sido iniciadas após 1906, como registra a pesquisa da
Dra. Teresa de Jesus Peixoto Faria, no texto “As reformas urbanas de Campos e
suas contradições”.
Ela
cita, em sua pesquisa, que havia, além da reformulação urbanística, a
necessidade de resolver questões d falta de saneamento, responsável pelas
epidemias, como a peste bubônica, que assolou o município, situação agravada
pela grande enchente verificada naquele ano, resultando em inundações, o que
levou o médico Dr. Benedito Pereira Nunes, idealizador da “cidade saneada”, a
observar que, em 1906, nada tinha sido feito com relação ao projeto de
Saturnino de Brito. E fez o seguinte discurso, publicado na Gazeta do Povo,
solicitando a intervenção do Governo Federal:
Em 1901, quando presidia a Câmara
Municipal de Campos, eu disse que, realmente, Campos, doada de uma natureza e
de situação topográficas excepcionais e que poderia ser chamada a Sultana da
Paraíba se transformou, por negligências da engenharia indígena e da edificação
colonial numa cidade de ruas tortuosas, de becos e de ruelas escuras, cheia de
casebres obscuros e insalubres, criando, assim, um ambiente de condições
idênticas às das cidades asiáticas, onde a peste é endêmica. Os velhos casebres
que existem ainda hoje e onde vive a classe operária pagando baixos alugueis,
confirmam este estado de coisas. Atentados flagrantes às regras de higiene,
legitimando de maneira criminosa o direito dos proprietários pouco
escrupulosos, exploradores conscientes dos pobres moradores de casebres úmidos,
verdadeiros pardieiros pagos com o suor das vítimas.
Tetê
Peixoto assinala: E é o próprio prefeito Ferreira Landim que, em novembro de
1906, anuncia, em discurso também publicado no mesmo jornal, no qual fala nas
dificuldades para colocar a arquitetura de suas habitações de conformidade com
os novos modelos em difusão: “O problema
de salubridade das habitações exige, mais do que nunca, a atenção do poder
municipal. É necessário melhorar as condições de higiene das casas, transformar
o sistema de edificações, expurgar a cidade dos velhos casebres, focos de
infecções de toda a espécie – da tuberculose e da peste, principalmente. No ano
passado, fiz demolir nos termos da lei, 45 desses velhos pardieiros e as
enchentes completaram, em parte, esta obra de saneamento (...)”. A reforma
urbana na cidade de Campos dos Goytacazes obedecia, em tese, ao que era feito
no Rio de Janeiro, nos tempos de Pereira Passos, por volta de 1904.
Da
lista de demolições de velhos edifícios, publicados em seu trabalho, que
parecem prejudicar a imagem da cidade constam 32 demolições e foram condenados
16; construíram-se nove casas novas; 18 foram totalmente reconstruídas, e 16
parcialmente; foram feitos 48 grandes reparos e 217 pequenos reparos. E o Dr.
Pereira Nunes, condenou a cidade “velha”, segundo ele, invadida por ratos. E
reafirma que “Campos reclama de medidas como impermeabilização do solo e a abertura
de áreas de circulação”,
No
documento, a pesquisadora salienta (...) O velho tecido urbano é transformado,
progressivamente, graças às reformas que visam, além do embelezamento da
cidade, dar-lhe uma melhor funcionalidade, adaptando-a aos interesses da
economia capitalista e da burguesia em plena ascensão. Finalmente, neste começo
do século XX, é necessário dotar a cidade dos símbolos do progresso e de uma
imagem de modernidade.
E
ele descreve algumas mudanças operacionalizadas com as reformas do Plano
Saturnino de Brito: “As Ruas: 21 de Abril, Sete de Setembro, Constituição (Rua
Alberto Torres) e Formosa (Tenente Coronel Cardoso) foram alargadas; a antiga
Praça das Verduras (Praça do Chá-Chá-Chá) foi urbanizada e transformada em
praça de lazer; a Praça São Salvador, já com belo jardim, é ornamentada com uma
fonte, os edifícios se renovam como o Renne, o Café High-Life,m Bom Marché e
novos edifícios surgiram, como o do Banco do Brasil (1910), Associação
Comercial de Campos (1913), Correios e Telégrafos e sede da Lira de Apolo
(1917) e o antigo Teatro Trianon (1921). Desses citados, somente sobreviveram o
Renne (com mudanças nos anos 50) e a Lira de Apolo (ora em restauração).
Hoje,
o conjunto de obras ecléticas, o maior do interior do Estado, praticamente está
restrito às Ruas: 21 de Abril, Santos Dumont, Teotônio Ferreira de Araújo
(antiga Barão de Cotegipe), Praça do Santíssimo, Sete de Setembro, 21 de Abril,
Avenida Rui Barbosa, Rua 13 de Maio (antiga Rua Direita) e Rua Formosa (Tenente
Coronel Cardoso), embora existam outros espécimes da época espalhados por
outras artérias da cidade, atingindo até bairros mais distantes e em alguns
distritos, como Goytacazes, Dores de Macabu, Murundu, Santa Bárbara, Vila Nova,
Morro do Coco, Santa Maria e Santo Eduardo. Só para citar alguns...
O
centro histórico de Campos é, com outros avanços ocorridos nos anos 40, por
intervenção da empresa Coimbra Bueno, nos tempos áureos do Prefeito Salo Brand,
que era engenheiro, o que estabelece a Lei (Plano Diretor) 7.972, de
30/03/2008, quando se inicia, embora tardiamente, a se adotar uma política de
preservação do patrimônio Histórico e Cultural do Município, cuidando de suas
instâncias materiais e imateriais.
Inventário em:22/05/2015
Fotografia: Valdimir da Silva
Salino
Responsável: Orávio de Campos
Soares
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